Para falar sobre o surgimento da Fonoaudiologia no Brasil é
importante destacar em que área situa-se o início do histórico (Didier, 2001).
Isto porque os autores que estudaram a origem da Fonoaudiologia no Brasil têm
indicado, de modo geral, que diferentes contextos políticos e lingüísticos
influenciaram o início da prática fonoaudiológica em diferentes regiões do país
(Berberian, 1997, 1998; Didier, 2001).
Em São Paulo, por exemplo, o início da Fonoaudiologia foi
marcado por um discurso "higienizador", a favor de uma
"patologização" das diferenças lingüísticas, decorrente da idéia de
"contaminação da Língua Nacional" provocada pelos movimentos
imigratórios nacionais (nordestinos) e estrangeiros (italianos, árabes,
japoneses, etc.). Neste período, final do século XIX e início do século XX, São
Paulo vivia um processo de urbanização extremamente acelerado, resultante do
declínio da cafeicultura, do final da escravidão e da intensificação das
atividades industriais. Os aglomerados populacionais que estavam se formando
eram constituídos por grupos de diferentes culturas, raças e línguas. Tal
heterogeneidade cultural e, principalmente, lingüística levava à concepção de
existência de uma "patologia social" e de que a Língua Oficial
poderia ser o principal instrumento de uniformização nacional. A intenção
preconizada, na época, era a erradicação das minorias lingüísticas, fossem elas
decorrentes de problemas orgânicos, culturais ou sociais. Portanto, os
primeiros profissionais da Fonoaudiologia não fugiam à regra e defendiam esse
discurso "higienizador".
De modo diferente, no Nordeste (décadas de 20 e 30), os
primórdios da Fonoaudiologia estão relacionados a questões políticas não
partidárias, ligadas à educação e saúde das classes desfavorecidas
economicamente, partindo, especificamente, do fracasso na alfabetização destas
classes. Naquele momento, existia o preconceito da incapacidade para a
aprendizagem decorrente das condições deficitárias de vida. O interesse pelo
estudo dessa população levou ao conhecimento de que boa parte dela apresentava
problemas de linguagem. Assim, alfabetizadores (das escolas públicas) e
profissionais da área médica, preocupados com essa questão, procuravam conhecer
as causas dos problemas de linguagem, as quais, na maioria das vezes, estavam
relacionadas a aspectos orgânicos ou ao preconceito quanto à capacidade para
aprender a ler e escrever. A identificação dos referidos aspectos foi ponto de
partida para a definição e delineamento de técnicas de reabilitação para a
primeira causa - primórdios da Fonoaudiologia Clínica e de realfabetização para
a segunda causa - primórdios da Fonoaudiologia Escolar.
Nas décadas de 40, 50 e 60, várias instituições, a maioria de
caráter educacional, possuíam serviços de reeducação de linguagem, como por exemplo,
o Instituto Domingos Sávio (destinado ao trabalho educacional com crianças
surdas) e as escolas especiais da Associação de Pais e Amigos do Excepcional -
APAE, Instituto Pestallozzi, Escola Ulisses Pernambucano, além do Serviço de
Educação Especial da Secretaria Estadual de Educação de Pernambuco. Nesse
período, os profissionais que estavam envolvidos com estes problemas, receberam
diferentes denominações: "realfabetizadores",
"reeducadores" de linguagem e "logopedistas". A denominação
"fonoaudiólogo" só viria a ser utilizada na proximidade da
implantação do curso de Fonoaudiologia.
Em 1976, foi aprovado pelo Conselho Federal de Educação o 1º
Currículo Mínimo para o Curso de Fonoaudiologia. O profissional formado por
este currículo valorizava o tecnicismo, buscando, assim, a reabilitação das
manifestações patológicas da linguagem.
Durante a década de 70 e início dos anos 80, em todo o
Brasil, os cursos de Fonoaudiologia formavam tecnólogos e tinham uma duração de
2 anos e 6 meses, com carga horária de 1.800 horas/aula. Por força da Lei de nº
6.965, de 09 de dezembro de 1981, a profissão de fonoaudiólogo foi
regulamentada e reconhecida em todo o território nacional. Por essa razão, o
dia 09 de dezembro foi instituído o "Dia do Fonoaudiólogo".
Além de regulamentar a profissão, com a Lei, foram criados os
Conselhos Federal e Regionais de Fonoaudiologia, tendo como principais
finalidades normatizar e fiscalizar o exercício profissional. As atividades do
Conselho Federal de Fonoaudiologia tiveram início em 1983. Em 15/09/84, pela
Resolução CFFa N° 010/84, foi aprovado o primeiro Código de Ética da profissão,
que elencava os direitos, deveres e responsabilidades do Fonoaudiólogo,
inerentes às diversas relações estabelecidas em função de sua atividade profissional
(Adaptação da Declaração de Genebra 1948, Conselho Federal de Fonoaudiologia).
Em uma resolução posterior (06/83), o Conselho Federal de
Educação transforma todos os cursos de formação de Tecnólogos em "Cursos
de Graduação Plena em Fonoaudiologia", equivalente ao Bacharelado,
exigindo, com isso, uma reformulação curricular em todos os cursos existentes.
Este novo Currículo Mínimo, contudo, ainda mantinha uma forte
influência do tecnicismo, herança das décadas passadas. Para que fosse possível
acompanhar o avanço científico e tecnológico que ocorria na área, esse
currículo passou a sofrer, paulatinamente, algumas modificações, na tentativa
de acompanhar o ritmo evolutivo da ciência, além de minimizar a influência do
tecnicismo. Iniciou-se, então, uma ampla discussão em torno do currículo do
curso, abrindo caminhos para se questionar um novo rumo para a Fonoaudiologia
enquanto ciência.
No início da década de noventa, a necessidade de revisão dos
currículos para a formação do fonoaudiólogo passou a ser alvo de fortes
discussões, diante das exigências de uma sociedade cada vez mais pluralista.
Ainda no final dessa década, em 1998, o MEC, através de uma comissão de
especialistas na área, inicia a elaboração das novas Diretrizes Curriculares
para os cursos de Fonoaudiologia, objetivando atender às grandes mudanças e aos
avanços dessa ciência.
Em 2001, o Conselho Nacional de Educação aprovou as
Diretrizes Curriculares Nacionais dos Cursos de Graduação da Área de Saúde, que
incluía o Curso de Fonoaudiologia. Essas Diretrizes preocupam-se,
essencialmente, em garantir uma sólida formação básica, preparando o futuro
graduado para enfrentar os desafios das rápidas transformações da sociedade, do
mercado de trabalho e das condições atuais de exercício profissional.
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